SOBREPOSIÇÕES > Origens
Os
estados quânticos podem ser representados por vetores pertencentes ao chamado
Espaço de Hilbert. Os vetores fornecem a estrutura ideal para representar regularidades específicas, especialmente quando
observáveis incompatíveis estão envolvidas. Para ver como isso funciona, seja

um vetor de comprimento unitário no plano e considere suas projeções em dois eixos ortogonais

e

(figura 5). Pelo teorema de Pitágoras:
Agora suponha que nós medimos um observável
A que somente pode assumir dois valores,

e

. As probabilidades de obter

e

variam em função da forma na qual o sistema medido tenha sido preparado.
Figura 5. Um vetor unitário no plano e suas projeções no eixo.
Ainda assim, desde que

e

representem resultados mutuamente excludentes que esgotam o espectro de ocorrências possíveis, nós sabemos
a priori que, em todos os casos, as probabilidade correspondente obedece à condição:
O formalismo preditivo da teoria quântica é baseado no paralelismo entre a eq. (1) e a (2). Ele é resumido pelas seguintes regras:
I.
Os valores

que um observável
A pode assumir são representados por eixos ortogonais

gerando um
espaço de estados.
II. Cada procedimento experimental que ‘prepara’ um sistema antes de uma medição de A é representado por um
vetor de estado 
pertencente ao
espaço de estados e tendo comprimento unitário.
III. (
Regra de Born) Se nós medirmos o observável A, a probabilidade

de obter o valor

é dada pela módulo quadrado da projeção de

sobre o

eixo:
Figura 6a e b. Representação do autovetor 'para cima' de Sz . O vetor antiparalelo serviria tão bem quanto esse - nós escolhemos arbitrariamente vetores pertencentes ao semicírculo unitário positivo para representar os estados quânticos.
Um corolário importante das regras I-III é o seguinte: o
vetor de estado 
que corresponde ao caso especial no qual nós prevemos
com absoluta certeza (i.e. com probabilidade 1) que a medição de A terá como resultado o valor

é o vetor unitário que está no

eixo (

). Usando a notação de
Dirac, esse vetor é descrito por

e chamado de um
autoestado (ou autovetor) de
A.
Vamos aplicar as mesmas regras simples aos experimentos de Stern-Gerlach discutidos na seção sobre
evidência experimental. Nós estamos focados em dois observáveis de
spin:
Sz, que pode assumir os dois ‘valores’

e

; e
Sx, que pode assumir os dois ‘valores’

e

. No primeiro passo do experimento (
figura 2) somente aqueles átomos para os quais uma medição de
Sz tem como resultado

são selecionados. Para esses átomos, nós encontraremos com certeza

se uma medição de
Sz for repetida. Assim, o
vetor de estado associado é

.Se, sobre a amostra de átomos assim preparada, nós agora medirmos
Sx, nós encontraremos

para metade dos átomos e

para a outra metade (passo 2 da
figura 3). Esse resultado pode ser representado no nosso
espaço de estados? Sim, é suficiente tomar os dois eixos correspondentes a

e

(ver regra I) formando um ângulo de π/4 com os eixos correspondentes a

e

(figura 6a). De acordo com a regra III, para conseguir descobrir a probabilidade de encontrar

nós temos que projetar o
vetor de estado 
sobre o eixo correspondente a

(figura 6a). Da mesma forma nós calculamos a probabilidade de que a medição de
Sx vai ter como resultado

. Nós obtemos:
O resultado do terceiro experimento (
figura 3) pode ser formalizada de modo direto da mesma forma, observando que os dois primeiros aparatos ‘preparam’ o
estado 
(figura 6b).
Vamos ver como os
fenômenos de interferência são levados em consideração neste modelo simples. Manipulando as regras básicas da composição de vetores no plano, os vetores

e

podem ser reescritos como:
Note que ambos esses
estados preveem a mesma
distribuição de probabilidade para uma medição de
Sx:

. Assim, os dois
estados (ou, para ser mais preciso, as preparações correspondentes) não podem ser distinguidas
a posteriori pela realização de tal medição. As duas preparações, entretanto, fornecem resultados estatísticos opostos se uma medição de
Sz for realizada (figura 7). No primeiro caso,
sempre se encontrará ‘

’; enquanto que no último, isso
nunca acontece. Esse ‘nunca’ é a assinatura da
interferência (compara com as franjas claras e escuras do
experimento de dupla-fenda). Note que a única diferença matemática entre os dois estados(3) é o sinal da
sobreposição: positivo no primeiro caso, negativo no segundo. Esse sinal expressa a
relação de fase existente entre

e

. (Usando notação complexa,

ou

dependendo se φ = 0 ou φ = π; vale a pena comparar com o caso das
ondas.)
Figura 7. Comparação das distribuições de probabilidade previstas por duas sobreposições diferentes de autoestados de Sx'.
Até agora, nós estávamos nos preocupando com uma classe especial de observáveis, aqueles que podem ser representados por eixos ortogonais diferentes dentro do
mesmo espaço de estados. As
distribuições de probabilidade associadas com tais observáveis são rigidamente conectadas entre si. No caso de
Sz e
Sx, por exemplo, nós vimos que, dada uma distribuição equiprovável de ‘para cima’ e ‘para baixo’ para
Sx, a estatística de
Sz segue necessariamente uma das duas distribuições representadas na figura 7.
Entretanto, existem observáveis cujas respectivas
distribuições de probabilidade são
a priori completamente independentes. Um exemplo típico é o dos observáveis de
spin de duas partículas distintas. A partícula 1 pode ser preparada de tal forma que

e a partícula 2 de tal forma que

. (Isto
não pode ser feito se
Sx e
Sz forem medidos na
mesma partícula, já que
Sx e
Sz são
observáveis incompatíveis.)
Em geral, entretanto, uma vez que dois sistemas quânticos tenham interagido, eles se tornam correlacionados de modo que os resultados de medidas não podem ser mais previstos simplesmente se atribuindo um
vetor de estado individual para cada sistema parceiro. Ao invés disso, um
vetor de estado único e global deve ser associado com todo o par. Esse
estado é construindo ao se combinar os
vetores de estado individuais, mas pertence a um
espaço de estados mais amplo. Um
estado emaranhado de duas
partículas de spin ½ é o seguinte:
As previsões estatísticas associadas com o

são muito importantes. A
probabilidade de encontrar ‘para cima’ ou ‘para baixo’ se
Sz (ou qualquer outra componente de
spin) for medida em cada partícula separadamente é 1/2. Além disso, se uma das partículas for encontrada com
spin ‘para cima’ na direção z, o resultado de qualquer medição de
spin realizada subsequentemente
na outra partícula seguirá as estatísticas previstas por

. Se, ao contrário, a primeira partícula for encontrada com
spin ‘para baixo’ na direção z, então as estatísticas da outra partícula serão aquelas correspondentes a

. Devido a forma peculiar do estado (4), correlações análogas existem para
qualquer componente de
spin. Assim, se, por exemplo, a partícula 1 for encontrada com spin ‘para cima’ na direção x, a partícula 2 seguirá as previsões de

; e assim por diante (a situação está representada na
figura 4). De fato,

preserva sua forma matemática se expresso em termos dos
autovetores de
Sx:

.
As
distribuições de probabilidade observadas em medições realizadas em uma partícula individual são fundamentalmente diferentes dependendo se a partícula tem ou não um par
emaranhado. No primeiro caso, como mostrado na figura 8, os
efeitos de interferência são eliminados (isso pode ser facilmente derivado da definição acima de

usando as fórmulas (3); ver também
complementaridade).
No modelo simples utilizado em nossa apresentação, o
espaço de estados era o plano real da geometria euclidiana e os resultados eram representados pelos eixos. Entretanto, uma análise completa de todas as medições possíveis em um Stern-Gerlach mostra que este espaço é insuficiente para fornecer uma representação completa. Uma estrutura geométrica mais rica, o
espaço de Hilbert, definida no campo dos números complexos, deve ser introduzida. Dentro desta estrutura, os resultados são representados por
subespaços, e os observáveis por combinações de
projetores sobre esses subespaços.
Figura 8. Distribuições de probabilidade encontradas quando a partícula testada (partícula 1) tem uma parceira emaranhada.